A CULTURA DO DESENCANTO

Jackson Araujo
15 min readSep 26, 2024

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COMO A CENA RAVE E PÓS-PUNK MOLDARAM O FREAK STYLE DE HOJE

Precursor do Freak Style, Keith Flint (1969–2019), vocalista e dançarino do The Prodigy, encarnava a fusão entre o cyberpunk e o grotesco.

A Cultura Freak Style dos Anos 2000: Desilusão Pós-Punk, Rave, The Prodigy e a Estética Bizarra

Os anos 2000 estão sendo marcados pelo crescimento de uma estética ousada, rebelde e visceral que se consolidou sob o rótulo de freak style. Essa cultura surgiu nos anos 1990 como resposta ao desencanto com a uniformidade e a estagnação cultural predominante no mainstream, misturando influências de movimentos como a desilusão pós-punk, o surgimento da rave culture, o sucesso de bandas como The Prodigy e a estética perturbadora promovida por artistas como Marilyn Manson. Para entender como essas forças moldaram o estilo freak, sugere-se analisar a interseção entre música, moda e arte visual, assim como o impacto cultural do inglês Keith Flint (1969–2019) e o duo sul-africano Die Antwoord.

Desilusão Pós-Punk e a Cultura Rave

O fim dos anos 1970 e início dos anos 1980 foram marcados pelo surgimento do pós-punk, um movimento artístico-musical que ressoava com a alienação e frustração pós-revolução punk. Enquanto o punk canalizava a raiva em uma explosão sonora crua e direta, o pós-punk adotava um tom mais sombrio e introspectivo, refletindo uma sociedade em desacordo com a modernidade industrializada. Bandas como Joy Division, The Cure e Siouxsie and the Banshees exploraram temas de desespero, existencialismo e isolamento, criando uma trilha sonora para aqueles que se sentiam desconectados das normas culturais.

A estética dark do The Cure no clipe assustador de "Lullaby".

Na década de 1990, o surgimento da cultura rave trouxe um novo escape. As raves, festas ilegais embaladas por batidas eletrônicas, luzes estroboscópicas e substâncias psicodélicas, ofereciam um ambiente de pura libertação. O estilo freak começou a emergir neste contexto, unindo a estética extravagante e colorida das festas raves com a atitude punk de contracultura e revolta. As roupas em cores neon, o cyber-goth e as performances excessivamente visuais das raves foram uma continuação dessa ruptura com as convenções sociais.

Rave: paixão e rebeldia

A cena Rave adotou a paixão pela liberdade de uma juventude rebelde e se transformou em algo como uma comunidade; seria uma forma de evolução do clube (ou boate), mudando efinitivamente a maneira coletiva de se festejar, desembocando nas atuais festas de rua.

A cena rave no Reino Unido no final dos anos 1980.

Alguns podem dizer que esse movimento foi alimentado pelo uso expansivo de Ecstasy e sua euforia amorosa, sendo a quebra de barreiras culturais o grande legado raver. Até então, o clube (ou a boate) era indiscutivelmente um idealismo limpo, caiado, direto e estreito; as raves ilegais empurraram esses limites, permitindo uma diversão mais inclusiva para uma gama de etnias, culturas e sexualidades.

A cultura Rave, então, na década de 1980, percebida pela lei como o lado sórdido das boates, tornou-se mais do que isso: uma revolta musical e uma rebelião cultural à “caixa” figurativa em que alguém deveria se enquadrar; seja no espaço do clube, na pista de dança, no guarda-roupa, nas normas sociais, popularizando o ideal das festas ilegais movidas a Ecstasy.

Não parece coincidência que a cena ilegal de raves tenham florescido no final dos anos 1980. Sob o pé cada vez mais duro do thatcherismo, a rave se tornou uma liberação moral, um movimento que floresceu no interior britânico como um abandono cultural direto do domínio autoritário da primeira ministra Margareth Thatcher, a dama de ferro.

Quebrando um impasse político e moral sob um governo conservador, pode-se entender a rave não apenas simplesmente como um lapso na moralidade juvenil ou uma reclamação crescente e barulhenta; foi de fato o símbolo de uma nova era da cultura da dance music e, espiritualmente, um senso de inclusão que talvez não tenha tocado a cena de festas até então.

A rave e a cultura rave floresceram incrivelmente desde então, de grandes festivais e cenas populares de clubes à moda. A cultura raver dos anos 1990 foi definida não apenas pela música, mas pelos visuais, sendo sinônimo de liberdade de expressão e inconformismo sob uma sociedade rígida. Uma revolução juvenil, de fato.

A evolução e o impacto duradouro da cultura rave e do movimento Acid House dos anos 1980 podem ser analisados pelos seguintes aspectos:

  1. Inclusão e Liberdade: A cultura rave é vista como um movimento que acolheu a diversidade, criando um ambiente de inclusão, onde as pessoas, independentemente de sua origem, se uniam para compartilhar uma experiência comum. A liberdade foi uma característica central, permitindo que os participantes expressassem sua individualidade tendo a body art e a maquiagem como aliados definitivos. É o caso do beauty-artist Victor Piercing, artista da noite precursor do uso de lentes de contato bizarras e muitos piercings em suas performances aterrorizantes.
Série de diferentes looks criador pelo próprio Victor Piercing para suas performances em palcos de clubs LGBTQIAPN+ de SP. Imagens encontradas na internet.

A persona Victor Piercing surgiu literalmente nos palcos das casas noturnas LGBTQIAPN+, onde apresentou uma imagem bem diferente das tradicionais drag divas que dominaram a cena nos anos 1990. Montado no melhor estilo goth-punk, Victor despontou dublando clássicos do rock, com performance agressiva e provocadora.

Ao longo dos anos 1990 até o início dos anos 2000, Victor Piercing foi único na cena queer, desbravando raves e clubes de diferentes lugares do Brasil e também na Itália. Atualmente, o artista nascido em Osasco se dedica a dar aulas de maquiagem artística, ensinando o aprendizado de autodidata. Na noite, Victor atua como doorman no Andrômeda Club, na rua Augusta, em SP. Leia entrevista com ele aqui.

Assista uma performance de Victor Piercing, na Boate Queens, em 1999.

2. Juventude e Individualidade: O movimento foi impulsionado por jovens que abraçavam sua identidade única, rejeitando normas sociais e culturais convencionais. A cultura rave se tornou um espaço de fuga e de celebração da autenticidade pessoal. No Brasil, mais especificamente na noite de SP, a figura do bailarino, barman e hostess Jota Jota Davis (1975–2024) é iconográfica nesse sentido.

Jota Jota Davis (1975–2014): "Sua figura meio centauro meio fauno foi conquistando espaço e admiração de muita gente que fazia a noite de SP" (Vitor Angelo).

Oriundo da cena "cybermano" — expressão dos anos 1990 de cunho preconceituoso com a geração de meninos e meninos das periferias que frequentavam as raves e a cultura clubber da cidade — , por congregar dança, moda e festa, valores que serviam de passaporte para adentrar o chamado "mundinho", Jota Jota rapidamente virou referência de festa boa, com gente montada e música de qualidade. "Mas quando o JJ surgiu, ele sofreu esse preconceito de ser chamado de cybermano, sim! Os 1990’s foram terrivelmente politicamente incorretos, né?”, diz Luiz Normanda, iconografia viva da cena clubber paulista. "Eu me defino como ex clubber, aposentada!", diz Normanda.

Muito antes dos aplicativos de celular, Jota Jota já gravava seus looks antes de ir ferver na noite de SP, no melhor estilo “get ready with me (GRWM), como se chama hoje nas redes sociais da vida contemporânea.

Como bem escreveu o jornalista Vitor Angelo: "Trabalhou como bailarino em diversos shows de casas noturnas, foi barman do Pix, host da Torre, do D-Edge e de tantos outros clubes. Sua figura meio centauro meio fauno foi conquistando espaço e admiração de muita gente que fazia a noite de São Paulo como proprietários de bares e boates, DJs, VJs, promoters e frequentadores (clubbers?), para logo se transformar em um ser mitológico da vida noturna da cidade. Uma pista sem Jota dançando ou uma entrada de clube sem seu sorriso na porta eram com certeza lugares menos felizes". Leia mais aqui.

3. Acid House como Revolução: O Acid House, subgênero da música eletrônica, foi central no nascimento da cultura rave. Com seu som repetitivo, hipnótico e inovador, marcou uma revolução musical e cultural, criando novas formas de interação social e celebração coletiva.

4. Legado Duradouro: O impacto da cultura rave e do Acid House vai além dos anos 1980 e tem influenciando a música, a moda e comportamentos sociais contemporâneos. A nostalgia em relação à cultura rave mostra como ela permanece relevante na cultura freak atual. Um bom exemplo no Brasil é o de Zezé Araújo, hostess e drag artist, que até hoje mantém viva sua persona freak atuando como hostess em três festas: a festa Dando , a POPPORN e a Clube Dando. Natural de Cacimba de Dentro, na Paraíba, Zezé começou a se montar em 2000. "Comecei a me montar mesmo, montação pesada no clube A Loca, onde comecei a trabalhar de divulgador e depois de performer e DJ. A Zezé Araújo nasceu lá no noite GRIND, principalmente as noites de rock do finado DJ André Pomba", revela.

As mil faces de Zezé Araújo, que se define como "uma gay curiosa, que aceita os defeitos dos outros porque eu também tenho defeitos".

Suas referências são múltiplas. "Olho para diferentes culturas mundiais, como Índia, China e México; cartoons; Herchcovitch, McQueen, Galliano e Mugler. As inspirações por traz dos looks vão de haute couture a halloween, teatro butoh e festas populares brasileiras. Tudo misturado. Se você procurar, sempre vai achar essas referências juntas ou separadas", conta Zezé. “Essas pessoas estão além de uma narrativa óbvia ou da discussão de gênero, são anteriores a tudo isso. E tem essa coisa de sair da periferia e se colocar no centro da cena”, analisa o consultor criativo Ricardo Oliveros, um entusiasta da arte da performance.

The Prodigy e Keith Flint: O Anti-Herói Freak

Keith Flint (1969–2019): vocalista e dançarino dos pioneiros da música eletrônica de Essex, The Prodigy, ele marcou toda uma geração como alguém cuja vocação não era simplesmente música — era uma expressão punk inflexível, uma maneira implacável de sair da normalidade.

Uma das maiores bandas a emergir da cena rave foi The Prodigy, que conseguiu misturar elementos de música eletrônica, punk e heavy metal em uma sonoridade única. O sucesso da banda nos anos 1990 e 2000 foi catapultado pela figura icônica de Keith Flint (1969–2019), o vocalista e dançarino cuja imagem agressiva e visual chocante personificava, e personifica, o espírito freak. Com seu cabelo colorido em chifres e uma atitude desafiadora, Flint encarnava a fusão entre cyberpunk e grotesco. Tudo devidamente disseminado e popularizado pela MTV, a internet musical da época.

A faixa “Firestarter” se tornou um hino para aqueles que rejeitavam a conformidade. A performance incendiária de Flint no videoclipe, com sua postura hiperativa e aparência demoníaca, ressoava entre os fãs que se identificavam com a sensação de alienação. Flint representava o desajustado que, em vez de tentar se encaixar, celebrava sua esquisitice, um aspecto central do ethos freak.

A Estética de Floria Sigismondi e Marilyn Manson

A diretora e fotógrafa Floria Sigismondi e sua criação bizarra para clipe de Marylin Manson.

Outra figura chave na formação da cultura visual dos anos 2000 é a diretora e fotógrafa ítalo-canadense Floria Sigismondi. Conhecida por sua estética distorcida e surreal, Sigismondi trabalhou com artistas como David Bowie e Marilyn Manson, criando imagens que desafiavam a percepção do belo e do grotesco. Seus videoclipes para Manson, especialmente “The Beautiful People”, apresentaram ao mundo uma visão macabra e perturbadora da humanidade. As imagens distorcidas, a iluminação sombria, o uso de maquiagem pesada e próteses criavam um mundo onde o bizarro e o excêntrico eram celebrados.

Marilyn Manson, por sua vez, tornou-se o próprio ícone dessa fusão de horror e alta-moda. Com sua maquiagem cadavérica, lentes de contato perturbadoras e figurinos que evocavam tanto o glam rock quanto o grotesco, Manson oferecia uma personificação do outsider. Ele encarnava a rejeição do conformismo e a celebração do bizarro, uma identidade que o tornaria um dos nomes mais influentes na cena freak do início dos anos 2000. A partir de 2019, Brian Warner, seu nome original, caiu em desgraça após denuncias constantes e acusações de abuso sexual e estupro.

Die Antwoord: A Nova Geração Freak

No final da primeiro década dos anos 2000, o duo sul-africano Die Antwoord trouxe uma nova dimensão à cultura freak. Formado por Ninja e Yolandi Visser, Die Antwoord mistura hip hop, música eletrônica e uma estética visual absurda e bizarra. Os videoclipes “Enter the Ninja” e “I Fink U Freeky” combinam imagens de alta estranheza com referências à cultura de rua e à arte digital. O estilo zef, que eles promovem, é uma celebração do “trash”, do exagero, e da estética que ignora as convenções de beleza.

O videoclipe seminal e hino da estética freak style.

O visual excêntrico de Yolandi, com sua maquiagem futurista e corte de cabelo punk, aliado ao comportamento agressivo de Ninja, encarna a liberdade artística e a rejeição das normas culturais que estão no coração do freak style. O sucesso internacional de Die Antwoord mostra que a estética freak não é apenas uma retrato marginal, mas uma força cultural global que ressoa entre jovens à procura de algo autêntico e disruptivo.

A Consolidação do Freak Style

No decorrer dos anos 2000, o freak style floresce como uma manifestação cultural que desafia as normas estéticas e comportamentais. Influenciado pela desilusão pós-punk, a energia caótica da rave, o anti-herói Keith Flint do The Prodigy, a arte perturbadora de Floria Sigismondi e Marilyn Manson e a estética desafiadora de Die Antwoord, essa cultura celebra o estranho, o bizarro e o grotesco. O freak não é apenas um estilo visual, mas uma afirmação de liberdade individual e uma rejeição às expectativas convencionais da sociedade. Na contemporaneidade, o freak style evolui e continua sendo uma poderosa força para a moda, música e cultura digital. Influenciadores, estilistas e artistas visuais de várias plataformas mantêm viva essa estética provocativa, desafiando normas sociais e visuais.

Aqui estão algumas figuras proeminentes do freak style de hoje:

Influenciadores Digitais

Salvia funde o digital e o humano de forma perturbadora e colaborou como beauty-artist para o estilista Rick Owens.
  1. Salvia (@salvjiia) — É uma influenciadora digital e artista visual que explora a estética alienígena, transgressora e futurista. Seu visual mistura maquiagem surrealista e CGI, fundindo o digital e o humano de forma perturbadora e fascinante. Ela é uma figura importante na cena freak style, com uma estética que desafia a ideia de beleza tradicional. Já assinou, inclusive, beleza do desfile Outono-Inverno 2019 do estilista Rick Owens, outro ícone do freak style.

2. Arca (@arca1000000) — A artista e produtora venezuelana tem uma presença forte tanto na música quanto na moda. Ela se destaca por sua estética desafiadora, que mistura elementos de androginia, futurismo e grotesco. Arca também é conhecida por colaborações com artistas como Frederik Heyman, incorporando freak style em sua música e videoclipes.

Arca em foto de Frederik Heyman para seu videoclipe "Non-binary"(2020).
O clipe em que Arca canta: "I don’t give a fuck what you think / You don’t know me".

3. Jenna Marvin (@genamarvin) — Gena Marvin (ela/dela, não-binárie), uma artista queer de uma pequena cidade na Rússia que encena performances radicais em público incorporando uma nova forma de arte e ativismo, que colocam sua vida em perigo. As performances, muitas vezes sombrias, evocativas e sobrenaturais, são queer em sua essência, chamando a atenção para o assédio da comunidade LGBTQ+.

Gena Marvin no documentário "Queendom" (2023), que marca a estreia da diretora Agniia Galdanova.
"Queendom" mostra a luta corajosa de Gena frente à LGBTQIAPN+fobia na Rússia, seu país de origem.

4. Fecal Matter (@matieresfecales) — Baseado em Montreal, Quebec, Steven é canadense e Hannah cresceu lá (nascida na Nova Zelândia). O casal se conheceu enquanto estudava design de moda no LaSalle College em 2014. A dupla também é DJ de sua própria música techno industrial. “Sempre achamos que com a cena de clubes e a vida noturna, nunca havia o tipo de música que queríamos ouvir, ou nunca chegava ao nível de intensidade que queríamos da música e da atmosfera e tudo mais, então decidimos fazer nós mesmos", diz Hannah.

"Temos a missão de apresentar pontos de vista alternativos, apresentando uma saída dos códigos de normalidade, pelos quais sentimos que sempre fomos presos", diz Steve.

A dupla de designers independentes oferece roupas e acessórios unissex cyberpunk por meio do aplicativo de vendas Depop. Steven se identifica como gênero não-binário: “Quando conheci Hannah, comecei a ter coragem de questionar meu gênero”, ele diz. Hoje, a dupla não deixa o gênero ditar como eles vivem. Hannah Rose Dalton é a cofundadora da Fecal Matter. Ela tem paixão por ativismo social e político desde jovem. Sua pesquisa sobre a indústria da moda e fast fashion, em particular, a levou a aprender costura e modelagem para que ela pudesse criar seu próprio guarda-roupa.

Influenciadores da vida real receberam o prêmio Digital Fashion Influencer of the Year em 2019 pelo Canadian Arts & Fashion Awards. Somando-se a uma carreira multifacetada, Hannah e Steven atuam como seus próprios maquiadores e cabeleireiros. O processo leva de 1h30 a 3h.

Fecal Matter surgiu por se sentirem oprimidos pelos aspectos técnicos de sua escolaridade. Alternativamente, Steven usa isso como combustível, tendo sofrido discriminação, bullying e violência enquanto crescia. Provoke Society é seu mantra. A dupla acredita que a sociedade vive com medo da liberdade de expressão e deve ser exposta a realidades além da norma para pensar criticamente e questionar suas crenças de longa data. “Ao nos expormos, temos a missão de apresentar pontos de vista alternativos, apresentando uma saída dos códigos de normalidade, pelos quais sentimos que sempre fomos presos”, explica Steven.

Estilistas e criadores de imagens

  1. Haris Nukem — Parte designer de moda, parte aficionado por histórias em quadrinhos, ele é um dos fotógrafos mais imaginativos e evocativos a surgir nos últimos anos. Influenciado pelo renascentista Caravaggio, seu trabalho é considerado um estudo apaixonado do espírito humano no século 21. Nascido em 1989 na Bósnia, tem uma estética marcada por retratos altamente estilizados, que misturam o grotesco, o dramático e o sombrio. Nukem explora a beleza em corpos tatuados, modificações corporais e a expressão visual extrema. Seu trabalho muitas vezes toca temas como sexualidade, agressão e vulnerabilidade.
"Bad Habbits", foto e styling de Haris Nukem.

2. Charles Jeffrey Loverboy — O estilista escocês é conhecido por suas coleções que fundem o club kid style (outra referência importante!) dos anos 90 com uma abordagem freak moderna. Suas peças são vibrantes, teatrais e deliberadamente desafiadoras, celebrando o exagero e a liberdade artística, especialmente nas cenas underground de Londres.

A estética club kid contemporânea no look dos modelos do desfile de Chales Jeffrey Loverboy.
Rouopas desfiadas e cabelos desgrenhados sugerem uma sensibilidade distintamente pós-punk.

3. Rick Owens — Embora conhecido por seu minimalismo sombrio, Rick Owens explora constantemente uma estética de desconstrução e rebeldia que flerta com o freak style. Suas roupas são arquitetônicas e muitas vezes alienígenas, e seus desfiles apresentam uma atmosfera apocalíptica, questionando a ideia de beleza tradicional.

O desfile de Rick Owens realizado com ícones da cena freak style, como Gena Marvin e o duo Fecal Matter.
Beleza alien grotesca do desfile de Rick Owens (2019) assinada por Salvia.

Bandas e Artistas Musicais

  1. Poppy — A artista norte-americana Poppy combina música pop com elementos de metal e uma estética perturbadora, mesclando a cultura digital e o freak style. Ela brinca com a dualidade entre o fofo e o macabro, muitas vezes em seus videoclipes, que alternam entre o surreal e o assustador.
Poppy combina música pop com elementos de metal e uma estética perturbadora.
Vocais, guitarras e bateria de influência metal fortalecem o visual lolita no meio de corvos.

2. Grimes — Mistura elementos de ficção científica e estética cyberpunk, criando uma atmosfera freak em sua música e videoclipes. Sua capacidade de combinar moda futurista com ideias de distopia e pós-humanismo a coloca como uma figura central no cenário freak contemporâneo.

Grimes como WarNymph vestida de Balenciaga: o avatar foi inventado para que a artista canadense pudesse separar sua vida digital de seu eu offline.
Grimes adota estética elfo-querumbim-alienígena em clipe de música com pegada electro e vocais etéreos.

3. Ashnikko — Com uma estética vibrante, hiper-colorida e provocadora, Ashnikko é uma cantora e rapper que encarna uma mistura de freak e cyberpunk. Seus videoclipes, como “Daisy” e “Cry,” trazem imagens surreais e exageradas que desafiam a estética pop tradicional, com influências de anime, terror e fantasia.

A cor azul é a marca registrada e Ashnikko. Sua música destrói o estigma sobre sexo e masturbação.
Entre a imagem de heroína de mangá e seria killer, Ashnikko transgride a previsível estética adolescente.

Videoclipes

  1. Lady Gaga — Mother Monster tem sido uma figura central na exploração do freak style no pop desde o início de sua carreira. O videoclipe de “Stupid Love”, lançado em 2020, reflete um mundo futurista e tribal, onde o uso de maquiagem e figurinos distópicos evocam a estética freak contemporânea. Como se não bastasse, ela agora contracena com Joaquin Phoenix em "Coringa", que ganha um álbum inédito da cantora, "Harlequin", concebido como uma companhia para a trilha sonora original do filme.
O novo álbum de Lady Gaga, lançado nesta sexta (27.09) e a Mother Monster ao lado de Joaquin Phoenix em "Coringa".
A Mother Monster prossegue desafiando a obviedade do imagineario de uma heroína pop.

2. FKA Twigs — É uma artista contemporânea que explora a estética freak com uma mistura de sensualidade e estranheza. O seu novo videoclipe “Eusexua” apresenta uma estética única e provocativa que explora temas de sensualidade, identidade e poder feminino. Por meio de sua mistura característica de música, dança e arte visual, FKA Twigs continua a desafiar convenções e a explorar o corpo feminino como uma forma de expressão criativa e espiritual.

Imagem da capa do novo álbum de FKA Twigs a ser lançado em janeiro de 2025.

“Eusexua” utiliza elementos surreais e simbólicos, refletindo a exploração do desejo e da autonomia sexual de uma forma artística, além de reafirmar o domínio da cantora sobre a sua própria narrativa. A estética do vídeo, marcada por visuais futuristas e uma coreografia intensa, evoca o poder da metamorfose e da fluidez, temas recorrentes na obra de FKA Twigs. Ela constrói uma atmosfera que mistura o ritualístico com o tecnológico, mostrando sua capacidade de integrar o emocional e o corporal de maneiras inovadoras. O clipe também pode ser visto como uma celebração da liberdade corporal e da subversão de normas, reforçando o lugar de FKA Twigs como uma das artistas mais vanguardistas de sua geração.

Em seu mais novo video FKA Twigs mistura o ritualístico com o tecnológico, o emocional e o corporal.

3. Die Antwoord — “Banana Brain” — Embora Die Antwoord tenha surgido no final dos anos 2000, eles continuam a ser referências atuais no freak style. O videoclipe de “Banana Brain” exemplifica o exagero, com cores vibrantes, cenas chocantes e uma fusão de cultura pop com imagens perturbadoras.

Die Antwoord: Ninja e Yolandi personificam a imagem do freak style contemporâneo.
A energia sonora da rave, a atuação punk de Ninja e os vocais infatilizados de Yolandi garantem o clima freak.

Por fim, vale ressaltar que em um mundo cada vez mais decadente e super saturado de conexões, o freak style é um marco continuamente atualizado pela moda, música, arte visual e, sobretudo, pelo comportamento jovem impulsionado pelas múltiplas questões contemporâneas: o caos climático, a derrocada dos tradicionais formatos de família, educação e governabilidade, a pauta decolonial, a visibilidade do movimento negro, indígena e LGBTQIAPN+, a luta pela positividade corporal e anticapactisimo, o boom dos jogos de azar nas redes, o ressurgimento do nazi-fascismo, a dizimação do Estado Palestino, os incêndios, as pandemias, as catástrofes naturais em expansão, o crescimento da violência sobre gênero, raça e classe social… Tudo ao mesmo tempo agora exposto como finas membranas… É oficialmente chegado o tempo do "no future", anunciado pelos Sex Pistols no hit "God Save The Queen" (1977):

Don’t be told what you want to want to
And don’t be told what you want to need
There’s no future, no future
No future for you…

When there’s no future, how can there be sin?
We’re the flowers in the dustbin
We’re the poison in your human machine
We’re the future, your future…

No future
No future
No future for you.

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